O QUE FALTA É JUSTAMENTE CULTURA

Foto: Divulgação

Um mês longe dos microfones não me deixaram inerte aos fatos ocorridos nestes dias. Uma coisa é bem dita neste momento: De tédio ninguém morre no Brasil. Tudo acontece numa proporção e velocidade que poria qualquer cronista da história em parafuso. Os fatos se sobrepõem não dando margem a reflexões dos acontecidos recentes, pois, sempre surge uma novidade que contamina qualquer reflexão sobre o que passou.

Tinha ideia de comentar o juiz de garantia neste espaço. Os debates rasos que ocorreram nas ultimas semanas, entre elas lideradas pelo ex super ministro Moro que conhece a ciência jurídica como uma criança de 4 anos disse as barbaridades de sempre, mas ao que parece ninguém tem dado bola por suas opiniões rasteiras, aliás nem seu chefe. Deixo para uma próxima oportunidade o meu comentário.

Mas o que fez mudar o curso deste comentário foi o secretário da cultura fazer um pronunciamento copiando descaradamente de uma fala do ministro da propaganda nazista Goebbels. Muito se falou e condenou sobre o pronunciamento transloucado e imbecil do ex secretário de cultura. No entanto o que devemos ter em mente são os fatos que transcendem a fala do ex-secretário. Aquilo que está escondido em suas palavras e que refletem a ideia de como a cultura seria tratada no atual governo.

Em sua live das quintas-feiras organizada pelo presidente Bolsonaro, o ex secretário da cultura participava daquela bizarrice semanal, foi efusivamente elogiado pelo trabalho realizado e pelo seu projeto de “cultura” que seria exposto em seu pronunciamento logos mais. Foi dito na live e no pronunciamento detestável, que a cultura brasileira passaria por uma renovação, valorizando os aspectos nacionais. Pela analise do discurso ainda na live presidencial e nas propostas apresentadas pelo ex secretário da cultura, se tratava de uma forma de monitorar e tratar as manifestações artísticas em todas as suas facetas, numa tentativa de valorização ao discurso de controle destes bens culturais como um braço das posições ideológicas defendidas pelo governo.

A cultura seria utilizada para instrumentar as posições extremistas concebidas pelo atual governo. O discurso de renovação e valorização do nacionalismo no ambiente cultural seria a consolidação e o caminho mais fácil de sedimentar os ideais fundamentalistas e ideológicos na sociedade brasileira, extirpando tudo aquilo que fosse contrário a estes ideais. Incutindo que tais manifestações seriam obra da esquerda, uma vez que, o marxismo cultural estaria contaminando nossa gente com valores anticristãos, desvalorizando a verdadeira e genuína cultura brasileira. Seria mais ou menos assim: mais saci-pererê e menos pato Donald, contanto que estejam alinhados a politica governamental, sendo mais claro.

Esta concepção dirigista da cultura e da arte por parte do Estado e da forma que vem sendo idealizando pelo atual governo é a antessala do totalitarismo politico. A última palavra pode parecer forte, e não se dará na forma que ocorreu no passado com outros países. Afinal num mundo interligado através da internet, o caminho a ser utilizado é justamente este; o de buscar nos modernos meios de comunicação digital a propagação destes ideais em relação à cultura. E não precisa de uma ação direta do governo. Seus apoiadores podem e fazem isto através das redes sociais alastrando as concepções ideológicas que são mais facilmente assimiladas por muito mais pessoas. Criando assim uma corrente de defensores destes projetos.

No entanto esquece-se os idealizadores deste projeto dito “cultural” que a cultura é fenômeno dinâmico e incontrolável. É chavão dizer que cultura e arte tem que ser transgressor. Está na sua essência. Politicas de direcionamento dos valores culturais não vingam. O Brasil tem reconhecimento internacional pelo seu multiculturalismo e diversidade. Qualquer atuação estatal que objetive seu controle para atender matizes ideológicas vai encontrar o fracasso como resposta.

Ministro da cultura é uma criação francesa. Lá, por razões obvias, foi criada esta pasta para atender quase dois mil anos de produção cultural e artística que influenciou, influencia e influenciará o mundo. Seu acervo cultural é imenso e necessitava de folego para não perder espaço no mundo. A cultura passou a ser um ativo politico necessário e útil para preservar os valores francos. Outros países copiaram o seu modelo, inclusive o Brasil, que teve seu primeiro ministro da cultura no governo Sarney. De lá para cá teve bons e mais ministros, mas nenhum com a vontade de se utilizar as artes como elemento de divulgação politica. Ou que pelo menos ficasse propagando que o que se produz é obra da esquerda ou da direita.

Os estados e municípios por sua vez replicaram em suas esferas governamentais as secretarias de cultura. Mas o que se viu foi escolha de alguns ocupantes sem o requisito básico para ocupar o cargo: cultura. Muitos deles se tornaram apenas organizadores de festas ou eventos que contabilizassem votos ao chefe politico. Politica de valorização cultural somente se sobrar algum capilé depois das festas promovidas. Assim as produções culturais acabaram esquecidas.

A saída do secretário de cultura não encerra a discussão de qual politica cultural que o governo federal escolheu para adotar. Ainda há muitos pontos obscuros que precisam ser esclarecidos. A escolha do novo ocupante da pasta vai sinalizar o que se espera para a cultura nacional. 

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