O 142 DA DISCÓRDIA

Foto: Divulgação

Como eu disse na última segunda-feira, abordarei hoje sobre um artigo da constituição federal que virou de uma hora para outra o assunto da imprensa e de juristas e que tem sido alvo de inúmeras discussões sobre sua aplicabilidade no atual contexto político do Brasil e nesta toada tem muita gente falando besteira, inclusive um conceituado advogado.

 

Vejamos então a descrição do artigo 142 da CF para depois fazermos as considerações pertinentes. A ele então: “As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem. O artigo contém ainda três parágrafos e dez incisos.

 

O busílis do artigo diz respeito da possibilidade ou não das forças armadas atuarem como um ente moderador nos momentos de grave crise institucional, como querem interpretar alguns, sem levar em atenção a essência do citado artigo. O renomado jurista Ives Gandra, partidário de uma interpretação que com todo respeito, não se sustenta, diz que as forças armadas sejam convocadas para impor a lei e a ordem nas tensões entre os poderes da república. Sua defesa neste entendimento veio na esteira da decisão do ministro Alexandre de Moraes de impedir a nomeação do Ramagem como Diretor Geral da Policia Federal. Afirma o jurista paulista que o conflito em relação a escolha do presidente da república e a decisão o Ministro Moraes, independente de quem tem razão, poderia as forças armadas intervirem para pôr a lei e a ordem.

 

Antes de ingressar nas minudências jurídicas que a discussão exige, contraponho a posição de Gandra apenas para afirmar como seria uma mediação de quem tem em seu poder o uso de armas? Isto ele não responde. Quanto as outras interpretações do ponto de vista hermenêutico são facilmente derrubas por falta de consistência argumentativa.

 

Primeiro ponto a ser atacado do ponto de vista interpretativo é de que o chefe supremo das Forças armadas é o presidente da república, que é a consagração da supremacia do poder civil sobre o militar. Isto é uma conquista civilizatória, comum nas democracias pelo mundo. Um dado importante que não deve deixar de lado que o fiel da balança para a manutenção da democracia são os três poderes da república e não as forças armadas. Eles são garantidores da ordem e da lei e não das democracias. O que isto significa. Somente podem atuar quando convocado pelos poderes constituídos. Não podem intervir a qualquer tempo tem que vir acompanhado de fortes argumentos para acioná-los.

 

Um outro aspecto esquecido e defendidos por uma enormidade de juristas, são de que é a Constituição Federal que garante e protege o sistema político contra qualquer intervenção militar e não o contrário como uma minoria defende. Para garantir efetividade deste comando constitucional foi editado uma lei complementar de número 97 que em seu artigo 15, diz como deverá ser a atuação das Forças Armadas, obedecendo inclusive uma cadeia de comando, comando este diga-se de passagem civil. Tendo como não poderia deixar de ter, todo um procedimento prévio a ser seguido. E quando o texto legal fala em garantir a lei e a ordem significa em caso muito específico, nunca como agente moderador em conflito entre poderes. Enfim o papel das Forças Armadas é o de garantir a segurança e não o entendimento entre os poderes.

 

Para reforçar este entendimento que descrevi, o nosso texto constitucional estabelece que somente os poderes constituídos estão autorizados a refrear crises institucionais e não as Forças Armadas. Qualquer coisa em contrário, além de uma arrematada enviesada interpretativa, é uma tentativa de golpe as instituições. Seria um retrocesso democrático de vergonhosa repercussão negativa.

 

Assim caros amigos, espero que com esta resumida explicação sobre o citado artigo 142 da Constituição Federal o seu real sentido. Sinto dizer que o ilustre jurista Ives Gandra não só está errado como presta um desserviço ao expor uma interpretação absurdamente equivocada. Não estou só nesta empreitada. 98% dos juristas não endossam o entendimento do grande advogado paulista.

 

O que vemos são alguns jornalistas, sem conhecimento técnico e que defendem a ideia do Ives sob o argumento capenga de que por ser um antigo advogado e professor e que já atuava no STF quando ainda os atuais ministros nem frequentava as escolas primárias, como se fosse definitiva e acertada. O fato de ter experiência não se constitui de passaporte de que tudo que entende do ponto de vista das leis o faz como a voz única a ser ouvida. Respeito sua experiência que é inegável, seu amplo conhecimento, mas isto não faz estar certo quando interpreta e mal o artigo 142 da CF.

 

Em resumo. As Forças Armadas não podem servir de moderador nos conflitos entre os poderes pela simples razão de que a CF não lhes deu esta atribuição. Garantir a lei e a ordem diz respeito a segurança e ao cumprimento das leis vigentes, nuca como um agente da moderação. Qualquer coisa em contrário é puro golpe. Tenho dito.

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