PORQUE NÃO TE CALAS?

A frase acima foi dita pelo rei da Espanha Juan Carlos ao então presidente da Venezuela em um encontro no Chile das Américas, Hugo Chaves. A reprimenda atravessou o mundo e se tornou símbolo de pedir a alguém que pare de ficar falando besteira. Não lembro se o presidente venezuelano atendeu ao pedido. Acho que não. Chave era uma metralhadora a dizer besteiras e asneiras. Habito comum de tiranetes de república de bananas.

Trago esta pequena estória para ilustrar os dias que vivemos no Brasil. Tem-se usado mais os métodos de truculência para as pessoas parem de falar do que sugerir que as pessoas se calem ao ficar dizendo besteiras, sem com isto se faça por intimidação. Temos recentemente dois casos bastantes sintomáticos que são bastante representativos do que digo.

Primeiro falo da condenação por injúria do humorista Danilo Gentili a prisão por dizer palavras ofensivas a deputada Maria do Rosário. Sua pena foi de 6 meses e 28 dias de detenção em regime semiaberto. Cabe ainda recurso. Não vou aqui adentrar no mérito do processo uma vez que não tive acesso ao mesmo. Apenas tenho informações oriundas da imprensa. A discussão se concentra principalmente se a prisão seria uma pena dura demais a ofensa ou um cerceamento a liberdade de expressão ao qual o humor estaria inserido.

O humorista foi condenado por ter recebido uma notificação extrajudicial para retirada de conteúdos das redes sociais. Ao ver sua origem e a profissão de quem mandou o Danilo rasgou, e depois ele esconde com os dedos o início e o fim da palavra deputada e visivelmente deixa a expressão ”puta”. Pega os rasgos destes papéis, põe dentro das calças os retira e remete de volta a Câmara dos Deputados, tudo isto gravado e exibido nas redes sociais. Deste ato considerado ofensivo, foi-lhe aplicado a pena de detenção.

A condenação gerou ao longo da última semana o debate sobre até onde vai o limite da expressão de pensamento e opinião. Ao humorista é dada a condição de dizer qualquer coisa uma vez que ele está expressando sua arte e qualquer condenação, seja moral ou jurídica, seria censura a sua arte? As discussões beiram a puro achismos, sejam de lado a lado. Para uns não competia ao Danilo fazer o que fez, pois ele desrespeitou uma autoridade e mais ainda uma mulher. Outros ainda afirmam que aquilo não era uma ofensa, mas apenas uma resposta ácida e irreverente a uma situação ao qual ele não concordava, no caso a notificação extrajudicial. Quem endossa esta opinião, é nada menos o Presidente Bolsonaro.

A despeito de tudo, resolvi meter a colher neste angu. A sentença de prisão em si é um exagero. Não vejo com bons olhos a possibilidade nestes casos que uma sentença penal condene a prisão o ato do humorista. Abre um precedente perigoso para situações futuras que envolvam expressar opiniões. Acho em minha modestíssima opinião que estas coisas deveriam ser tratadas na esfera civil, com condenações pecuniárias, assim como ocorre nas democracias mais civilizadas. Aliás, se o este caso acontecesse nos EUA, em razão da Primeira Emenda a Constituição não seria tratado como crime, pois lá permite a livre manifestação de opinião. Haveria apenas uma condenação em dinheiro a favor de quem fora direcionada as palavras ofensivas. E só.

O fato de achar que a condenação foi um exagero, não quer dizer sou favorável a livre manifestação de opinião e pensamento como uma coisa absoluta. Não. Mesmo numa democracia, expressar opinião e pensamento tem que estar enquadrado no limite que a constituição estabelece. Não é porque se é livre para dizer o que der na telha, que me é garantido dizer tudo. Se assim fosse, a liberdade absoluta, viveríamos numa anarquia. Não se pode a pretexto da liberdade expressar desrespeito a dignidade das pessoas, mesmo que isto seja encarado como uma piada, e assim ficar impune. Existe uma diferença entre proibir o que se pensa e censurar uma opinião. A linha é tênue. Compete em última instância ao judiciário estabelecer este limite. Mas com certeza não é com condenação a prisão.

O ato em si do Danilo Gentili a mim me parece sim ofensivo. Não encaro como uma expressão do humor. O humor ante de tudo é critica. Não vejo critica quando se chama alguém “puta” simplesmente porque não comungo com as atitudes e comportamento de seus alvos. O fato de desgostar de suas atitudes, também não me faz censor suas opiniões. Discordo naquilo que a lei me permite, o que me proíbe de atacar as liberdades individuais. Simplesmente desprezo sua atuação. E não acho engraçado.

Outro fato que já abordei aqui, diz respeito a decisão do Ministro Alexandre de Morais ao proibir a divulgação de uma notícia em um site noticioso e uma revista eletrônica que envolvia o presidente do STF. Insisto que não foi censura, pois esta significa impedir antes a divulgação de um fato noticioso e o que aconteceu foi suprimir o que já estava divulgado. Também não quer dizer que concordo com sua decisão. Foi sim equivocada e exagerada. Por sorte voltou atrás. Percebeu ainda de forma tardia que sua atitude foi além do permitido. Mas censura não foi. Lembrado aos incautos que nunca se viu uma campanha tão sórdida contra a mais alta corte do país. Algo precisava ser feito. O caminho escolhido pode até não ser dos melhores, mas do jeito que as coisas iam, é preciso freio.

Assim, meus caros, estes foram as duas situações que põe a prova a nossa tão incipiente democracia. Ainda precisamos aprender muito e estes acontecimentos, espero, deixem lições.

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